quarta-feira, 30 de abril de 2008

Os "P's" Que Faltam


Se cada dia cai, dentro de cada noite,
há um poço
onde a claridade está presa.

Há que sentar-se na beira
do poço da sombra
e pescar luz caída
com paciência.

Pablo Neruda

Este infame, apareceu-me hoje, sorrateiramente, para me lembrar dos "P's" que não sou no caminho para o Templo.
Perseverante, Paciente, Perscrutador, Pacato, Poderoso, Ponderado, Ponderoso,...
Preciso de formação em "P's"! De preferência com créditos!

sábado, 26 de abril de 2008

A Caverna dos Infames




"A Caverna dos Infames"
Lagoas de Bertiandos e S. Pedro de Arcos
25 de Abril de 2008

Ontem estivemos reunidos na Caverna a compactuar com a Infame-Mor, Mãe Natureza. A reunião contou com infames de todas as idades mas com um desejo em comum, elevar a Infame-Mor à qualidade de Rainha. A Caverna é o local preferido para estas reuniões secretas porque os semideuses não se atrevem a entrar onde, nas suas palavras, só há "bichos pegajosos", calor, humidade, teias de aranha, fetos com braços envolventes, tojos e silvas que passam por picos, pinheiros que não estão enfeitados com as cores do natal, aromas enjoativos, silêncio,... Enfim um local ideal para a comunhão entre Infames da Vileza!

domingo, 20 de abril de 2008

Perturbadores da Harmonia


"Perturbador da Harmonia"
Penha Garcia, Novembro 2007


A palavra perturbador(a) surgiu-me, hoje, em dois contextos diferentes mas que me encaminharam no mesmo sentido, a felicidade.
A primeira aparição foi no filme "The Pursuit of Happyness" de Gabrielle Muccino, quando a personagem principal cita a Declaração de Independência dos E.U.A., na qual os ingleses aparecem como "perturbadores da harmonia", e a segunda na revista NS, mais propriamente n' "O Sexo e a Cidália", quando a Cidália conclui que "As mulheres perturbadoras são aquelas que mais prazer nos vão dar".
Para se entrar no templo e ascendermos à categoria de semideuses não podemos ter "perturbadores da harmonia", não podemos deixar que pessoas perturbadoras entrem na nossa vida.
Quais são os perturbadores da harmonia deste Infame da Vileza que o impedem de entrar no templo? Incoerência, falta de coragem, ausência de bondade,... Dormir pouco, horários, dinheiro,...
Como gerir ou eliminar os perturbadores da harmonia? Como fazem os semideuses? Com ignorância? Cegueira? ...? A batalha não está perdida, ainda poderei aprender.
O problema maior, sem solução, são as pessoas perturbadoras. É que os infames, por natureza, só se aproximam e deixam aproximar este tipo de pessoas. As que magoam, as que dão trabalho mas nos indicam o caminho da felicidade, do prazer, .... Pessoas mornas, sem cor, sem sal, sem pimenta,... não são o prato predilecto do infame.
E agora? Como poderei entrar no templo?

sexta-feira, 18 de abril de 2008

Saber o Que NÃO É Melhor!

Estava eu na fase de relaxamento do processo de escultura deste corpo infame, para que se torne num corpo aceitável aos olhos dos semideuses, quando ouvi a seguinte frase de uma canção dos "The Gift": "SABER O QUE NÃO É MELHOR". E, se eu fosse um desenho animado, teria aparecido um ponto de interrogação e uma lâmpada por cima da minha cabeça.
Andei estes anos todos a acreditar que tinha uma das competências necessárias à entrada no Templo, SABER O QUE É MELHOR, quando de repente descubro que afinal o que fiz, faço e, talvez, farei é tentar, arduamente, SABER O QUE NÃO É MELHOR.
Os semideuses têm vidas perfeitas porque SABEM O QUE É MELHOR, os infames têm vidas aos tropeções porque SABEM O QUE NÃO É MELHOR.
E afinal O QUE É MELHOR? O Templo cada vez mais longe!

terça-feira, 15 de abril de 2008


Sophia Mello Breyner

As pessoas sensíveis não são capazes
De matar galinhas
Porém são capazes
De comer galinhas

O dinheiro cheira a pobre e cheira
À roupa do seu corpo
Aquela roupa
Que depois da chuva secou sobre o corpo
Porque não tinham outra
O dinheiro cheira a pobre e cheira
A roupa
Que depois do suor não foi lavada
Porque não tinham outra

"Ganharás o pão com o suor do teu rosto"
Assim nos foi imposto
E não:
"Com o suor dos outros ganharás o pão".

Ó vendilhões do templo
Ó construtores
Das grandes estátuas balofas e pesadas
Ó cheios de devoção e de proveito

Perdoai-lhes Senhor
Porque eles sabem o que fazem.

Sophia de Mello Breyner Andresen


Porque os outros se mascaram mas tu não
Porque os outros usam a virtude
Para comprar o que não tem perdão.
Porque os outros têm medo mas tu não.
Porque os outros são os túmulos caiados
Onde germina calada a podridão.
Porque os outros se calam mas tu não.

Porque os outros se compram e se vendem
E os seus gestos dão sempre dividendo.
Porque os outros são hábeis mas tu não.

Porque os outros vão à sombra dos abrigos
E tu vais de mãos dadas com os perigos.
Porque os outros calculam mas tu não.

Sophia de Mello Breyner Andresen


Hoje, numa perspectiva de ascensão ao templo, os infames reuniram-se em torno de vários prazeres. O manjar, o vinho,
em alguns casos o sumo, o doce e a poesia.
Para os semideuses não passou de um encontro inofensivo entre iguais. Os pobres de espírito que se deliciam em comezainas para esquecer as agruras da vida.
Para os infames funciona como um encontro de ideias, emoções, ... âmagos, onde se combinam estratégias para combater as influências divinas que imanam do templo.
Como acta de tal encontro deixo dois poemas de uma conhecida infame.

sábado, 12 de abril de 2008

Morte


O Dia da Morte; pintura de William-Adolphe Bouguereau (1825-1905)

"Aquilo que verdadeiramente é mórbido não é falar da morte, mas nada dizer acerca dela, como hoje sucede. Ninguém está tão neurótico como aquele que considera ser neurótico decidir-se a pensar sobre o seu próprio fim."
(Philippe Ariès)

A morte, óbito, falecimento, ... de um organismo vivo foi, é e será inaceitável para os semideuses e infames. A morte/dor/perda é unificadora, o único momento em que semideuses e infames comungam das mesmas sensações, dos mesmos pensamentos, dos mesmos espaços, ...
A morte de alguém a quem olhamos nos olhos, a quem sorrimos, a quem dirigimos palavras simpáticas, de quem recebemos em troca a mesma moeda causa frustração, impotência, confusão, ... e um aperto no coração ou no estômago ou por ali. Todas as teorias sobre a morte são esmagadas por esse aperto não sei onde.
Este reles infame sentiu esse aperto e mais uma vez a ideia, de que é um fenómeno natural, tal como o nascimento, que deve servir para louvar, foi esmagada, pisada,... por sucessivos apertos. E as migalhas que surgiram eram simplesmente pontos de interrogação, pontos de exclamação e muitas reticências. E todo o texto que foi construído com a vida é destruído pela palavra morte e o que fica são sinais de pontuação.
O que vai acontecer, mais uma vez, é que vou ter de apagar os sinais de pontuação e começar novamente a escrever o texto da vida.


quarta-feira, 9 de abril de 2008

A Mentira Branca


"A Verdade é dura como o diamante, mas delicada como a flor de pessegueiro." Gandhi

As crias dos semideuses ensinaram, este infame, a utilizar a mentira branca.
O semideus que se orgulha da sua educação e pedigree usa e abusa da mentira branca e permite que as suas crias a ostentem como orgulho da raça. A mentira branca é, para o semideus, a chave que abre as portas do social, do profissional e até do amoroso.
Esta lição serviu para me sentir mais próximo do templo. Eu sei que estou quase lá!

terça-feira, 8 de abril de 2008

Com Originalidade. Com o quê?


No templo dos semideuses surgiu, hoje, a palavra ORIGINALIDADE. Os infames questionaram-se sobre esta raridade, ainda por cima porque surgiu num contexto de avaliação do seu desempenho. Os semideuses aceitam um infame no templo se este for ORIGINAL ou fizer com ORIGINALIDADE.
Afinal o que é isto da ORIGINALIDADE e como se avalia?
ORIGINALIDADE é parente, em muitos contextos, de excentricidade, estranho, extravagante, bizarro, ...a etimologia da palavra empurra-nos para "início", "instauração".
Será que para entrar no templo dos semideuses basta, aos infames, darem "início" a uma metodologia extravagante? Tenho algumas ideias! Para ser ORIGINAL e entrar no templo bastará fazer o pino ao mesmo tempo que se explica a fotossíntese ou explicar o ciclo das rochas dançando "cu duro", ... Ainda há esperança para este reles infame!
Amanhã começarei a ser ORIGINAL logo ao pequeno-almoço, um galão com manteiga e um pão com leite e café. Já estou a imaginar, todos os semideuses a exigirem a minha presença no templo para contemplarem uma tão grandiosa ORIGINALIDADE.

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Desejo Vil


Victoria Falls


Uma boa experiência para qualquer semideus era ganhar uma viagem de ida para paraísos de liberdade como o Zimbabwe. Esta experiência talvez os fizesse perceber o quão perfeito é o seu templo e se deixassem de falsas e hipócritas profecias.

Alegoria versus Saga

"A Felicidade é uma alegoria e a Infelicidade é uma saga." Haruki Murakami

A Infelicidade é uma saga, lema dos semideuses que me rodeiam achando que dominam tudo com o seu sorriso forjado a ferro.

A Felicidade é uma alegoria, lema dos infames meus irmãos que aceitam quase tudo com um sorriso forjado a cores do arco-íris.

Poema em linha recta

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cómico criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado,
Para fora da possiblidade do soco;
Eu que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu que verifico que não tenho par nisto neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo,
Nunca teve um acto ridículo, nunca sofreu um enxovalho,
Nunca foi senão - princípe - todos eles princípes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana,
Quem confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó princípes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!
Onde há gente no mundo?

Então só eu que é vil e erróneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que tenho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

Álvaro de Campos